A partida dos dois comboios especiais com adeptos do Benfica rumo a Campanhã, no domingo, estava prevista para as 12.15 e 12.30 horas, respectivamente. Mas antes das 11 o reboliço já era enorme em Santa Apolónia. Centenas de adeptos do Benfica preparavam-se para viajar rumo ao Porto para assistir ao clássico acompanhados por dezenas e dezenas de agentes de segurança. A BOLA também fez a viagem.
(foto J.G.)
O rigor nas revistas à entrada para cada composição redundou em ligeiro atraso. De Lisboa partiram perto de 1500 pessoas — entre No Name Boys, Diabos Vermelhos e adeptos sem ligação a claques. Todos foram revistados de alto a baixo, cada mochila, faixa e bandeira perscrutada minuciosamente. Garrafas de vidro não entraram, mas carregaram-se muitas paletes de latas de cerveja e muita comida para a longa viagem.
(foto J.G.) AMEAÇAS LEVADAS A SÉRIO
Todos os cuidados eram poucos perante as ameaças que transformaram este jogo de futebol, que de nada de simples tinha, num barril de pólvora. Estas foram levadas muito a sério pelo Comando Nacional da PSP. Da suposta aquisição de milhares de bolas de golfe pelas claques portistas para serem arremessadas, à pretensa intenção de furtar veículos para os colocar em passagens de nível. Organizou-se a que terá sido a maior operação de segurança de sempre, não só em número de elementos e valências policiais envolvidas (total de cerca de 800 agentes), mas pela complexidade da operação. O apedrejamento ao autocarro do Benfica na véspera vincara o estado de alerta. De Lisboa foram perto de uma centena os agentes que viajaram nos comboios. Havia spotters em todas as carruagens. Naquela em que A BOLA viajou eram sete. A primeira composição de cada comboio estava reservada às forças de segurança: agentes do Corpo de Intervenção (CI), ainda mais spotters e até equipas da Cruz Vermelha, prontas a acudirem a qualquer emergência médica. Do lado dos adeptos as ameaças também pareciam ser levadas a sério. Os mais desconfiados quiseram verificar a espessura dos vidros. «Não parte com bolas de golfe», sentenciava um. «Tirando as pedras não deve haver problema», antecipava outro. DE LISBOA A CAMPANHÃ
O comboio onde seguiu a reportagem de A BOLA, o segundo, deixou Lisboa pelas 12.40 horas, em marcha vagarosa. Pouco depois, começavam os preparativos e ensaios para a que podia ser a tão ansiada consagração — o destino foi, afinal, apeadeiro de enorme desilusão e frustração. Muita cerveja já escorria pelas gargantas aos primeiros quilómetros, os farnéis eram prontamente espoliados e os cânticos começavam a animar o ambiente. «Cheira bem, cheira a Lisboa», ouvia-se. No ar, o cheiro era outro, sempre intenso ao longo da viagem, e fazia muita gente rir... A primeira de três paragens até ao Porto é no Entrocamento, às 13.55 horas. Para recolher mais adeptos, sempre minuciosamente revistados. Nova paragem em Coimbra, eram 15.16. Mais adeptos a entrar. Nesta altura, já deviam ser mais de 1700 no total. De todos os pontos do País. Deixado o Mondego, e com as emoções a ficarem ao rubro, começam a ver-se ao longo do trajecto bandeiras e cachecóis encarnados. E também polícia a cada apeadeiro, viaduto, passagem de nível ou até numa simples elevação no terreno. Faltavam dez minutos para as quatro quando se experimentou a primeira sensação de risco. Os spotters ordenam a todos para se sentarem. Os que iam em pé, sem lugar, fizeram-no no chão ou agacharam-se. Da carruagem da frente sai um graduado dos spotters de shotgun em riste. Já se atravessava território potencialmente hostil. Às 16.12, a penúltima paragem: Aveiro. E um contratempo: a segurança local com os adeptos locais colocou-se na linha errada. Uma camisola do FC Porto a passar fez aumentar a tensão por instantes. O contacto foi evitado. Os elementos do CI, nessa altura, já estavam munidos de tanto material que quase desapareciam no meio dele. Capacete, fato de protecção completo, shotguns, cartucheiras, escudos, espingardas para disparar gás lacrimogéneo. «Parece que vão para a guerra...», comenta-se. Havia uma sensação estranha e antagónica no ar: tamanho aparato gerava sentimento de segurança e... de receio. Entretanto, algumas carruagens já pareciam latas com sardinhas, mas faltava pouco para a Campanhã. Aumentaram as bandeiras de apoio, mas agora com muitas azuis pelo meio. Esmoriz, Ovar, Gaia... Sempre em segurança. A cidade invicta aproximava-se, a chegada deu-se às 17.23. Tudo correra bem, sem incidentes. RUMO AO DRAGÃO
(foto J.G.) Seguem-se as movimentações para dar início ao trajecto, em teoria, mais problemático: da estação ao Dragão. A saída do comboio é feita com mais revistas, para a certificação de que mochilas, sacos, o que fosse passível de ser carregado, não deixava as composições. Só bandeiras, cachecóis e objectos pessoais. A olho nu, na imensa coluna vermelha de centenas de metros que se preparava para deixar a estação a partir das 17.45 horas — onde se estimava que estivessem já mais de 2500 elementos —, viam-se mais de meia centena de spotters a abrir caminho, mais duas dezena na rectaguarda e o Corpo de Intervenção a encarregar-se de ladear e fechar a caixa. Ninguém a podia ultrapassar, senão era avisado, primeiro, e brindado com um longo e doloroso bastão, depois. O plano e as ordens tinham de ser escrupulosamente respeitadas, doesse a quem doesse - e doeu a muitos... O trajecto até ao Dragão, perto de dois quilómetros, passava pela rua Pinheiro de Campanhã até à VCI e por aqui até ao estádio. No ar estava um helicóptero a monitorizar as operações no terreno, a batê-lo com visão perfeita.
(foto J.G.) Imponente. Com a aproximação do estádio, nova situação de risco, a primeira intervenção policial. Carga sobre adeptos portistas que esperavam a coluna e atingiram com pedras um veículo, danificando-o severamente e ferindo uma senhora — alvo errado, danos colaterais. Cinco pessoas foram detidas por arremesso de pedras. A coluna seguiu caminho. Alguns agentes estavam mais tensos, e empurravam de forma bruta a rectaguarda para agilizar a passada. O caminho foi aberto na perfeição. Cada viaduto e acesso rodoviário foi controlado, todas as faixas de trânsito e zonas pedonais com adeptos azuis devidamente sustidas e bloqueadas até a coluna chegar à enorme escadaria que levaria à entrada para a bancada visitante. Para novas e minuciosas revistas, que fizeram com que demorasse mais de duas horas a chegada à entrada, mas quase todos a tempo do pontapé de saída do jogo. Nesse período, sempre muita tensão no ar e a certeza de que fora da coluna não havia ninguém de vermelho em redor do estádio. Pelo meio, já circulava que o autocarro do Benfica tinha sido apedrejado, atingido por bolas de golfe. Como a que foi arremessada para a coluna que já esperava a derradeira revista antes de entrar no estádio. Já nas bancadas, mais confusão até ao apito final [ver caixa].
(foto J.G.) SUSTO À SAÍDA DO PORTO Findo o jogo, espera de pouco mais de trinta minutos na bancada até ao caminho de volta a Campanhã. A derrota do Benfica reduzira riscos, mas o plano de segurança continuou a ser meticulosamente cumprido. Tendo por banda sonora o ruído das hélices do helicóptero que até durante o jogo sobrevoou o Dragão, porque a desilusão e frustração já eram tão grandes que só algumas dezenas de elementos ainda conseguiam entoar cânticos... O trajecto de regresso aos comboios fez-se sem sobressaltos, apenas trocas de bocas à passagem por habitações e umas quantas bastonadas em alguns que, distraidamente ou de propósito, passavam os limites da caixa. O embarque ainda demorou, mas o comboio seguiu o seu caminho já depois da meia-noite. O cansaço já era grande e esperava-se viagem tranquila para Lisboa. Não foi. Minutos depois da partida, sem a escuridão deixar perceber por onde os comboios passavam, pelo menos um deles foi apedrejado. Uma composição foi-o por três vezes. Dois vidros ficaram estilhaçados, os de uma porta partiram-se e atingiram os spotters. Momentos de tensão, mais uma situação de risco, mas a última da viagem que seguiu lenta devido às obras nocturnas em pontos da linha e que terminou já pelas cinco da manhã. Foi o final da história de uma ida a um jogo de futebol. E de como estupidamente ir ver um jogo futebol pode ser, apenas e só, um risco para os adeptos dos dois lados. |
gostei MUITO da analise final ...foi mesmo isso q me fez sair das claques ...
ResponderEliminarFantástica reportagem...
ResponderEliminarQuem foi acompanhar o Benfica, bem que pode tatuar no braço Porto 2010 Amor de Mãe. Vocês foram à guerra, amigos!
ResponderEliminarJá não se pode ir á bola em sossego! =s Muito boa esta "visão"!
ResponderEliminarse tiveres mais fotos diz sff. também lá estive e foi fantástico ;D
ResponderEliminarSEM MEDO!!
ResponderEliminarjá na altura dos dois do César Brito...foi uma guerra, estive lá, só que nessa altura a policia não protegia tanto...mas foi nestes que se deslocaram lá que pensei depois da derrota...campeões para a semana, o resto é treta.
ResponderEliminarNós eramos um grupo de 7 divididos por 2 carros. "Adeptos" do FCP estavam atrás de àrvores à nossa espera, eram uns 30, enquanto saimos do estadio!
ResponderEliminarQuando dou por mim, vejo o pessoal todo a cair no chao e eles a vandalizarem as malas do pessoal, estavam 3 gajos para me apanhar, mas consegui fujir pela rotunda a descer.
Estava a descer e ainda ouvia os gritos do pessoal!!! Chamei a policia de intervençao o mais rapido que pude e vieram uns 8 comigo pela avenida acima.
Seja como for, cá em cima estavam os 30 gajos a minha espera, mas eu ia com a bofia. A bofia deu lhes uma malha de porrada que dificilmente me vou esquecer.
Refugiamo nos num café (estava eu e os meus amigos que estavam no meu carro). Então andámos à procura dos nossos colegas do outro carro com uma amavel senhora do FCP que safou um colega meu enquanto levava na tromba no meio da rua, até o carro deles desaparecer e concluirmos que eles tinham conseguido ir embora.
Aí fomos embora também.
Nós não iamos com qualquer coisa do Benfica à mostra.
Portanto, nunca mais vou a jogos fora sem ser na "procissão". Acabou.
Anda tudo a assobiar para o ar!
ResponderEliminarO pessoal da politica, nem uma palavra perante o "estado de sítio" que se tranformou um jogo de futebol.
Mandaram o Comandante Geral da Policia dizer que foi um êxito a operação de segurança, pois até nem ouve mortos!
Estão a criar um clima que qualquer dia, se um individuo passa por um sítio com um simples emblema de um clube que não gostam leva porrada.
Entretanto...... estas coisas não esquecem e ainda há muita coisa para resolver.
Enquanto para os visitantes meteram numa caixa, os visitados deram-lhes bolas de golf para fazer "segurança".~
Com os bolas de golf, isqueiros, telemoveis e pedras, mesmo assim vamos ser campeões, pela simples razão porque este ano tivemos melhor equipa e é dentro do campo que conta.
Rumo à Vitória
isto traduzido para inglês e sem referências a futebol e locais específicos e o resto do mundo pensaria que se tratava de algo que tinha ocorrido no Iraque ou Afeganistão!!! ao que o futebol chegou!
ResponderEliminarsaudações benfiquistas:
ResponderEliminarfaço minhas as palavras do pozhumano....os benfiquisas que foram as antas no domingo foram à guerra...eu também lá estive, mas numa posição diferente, dado que estive no meio deles (curva por baixo do placard do lado dos sd)...à civil, e aconteceu algo que me deixa perplexo...esses inergumenos a atirarem moedas a um tipo da organização do jogo, só porque tava a mandar os senhores estarem mais calmos...sinceramente, e atenção que eu vou muitas vezes ao porto por razões familiares, mas nunca pensei que o odio que os adeptos desse clube sentem por nós fosse tão grande...é uma cena inimaginável ver um fruta-slb no meio deles, é um destilar de ódio impressionante...obrigaram um tipo com 1cachecol do slb a entregá-lo aos sd, sob pena de graves ameaças físicas e isto para não falar na não revista à entrada...se a dos amigos do cortejo foi minuciosa, a dos adeptos, ditos normais, não existiu...tipo, apalparam-me os bolsos, quem quisesse levar uma arma tinha levado.
meus amigos, eu não contribuo para esse peditório, isto tornou-se numa guerra civil que só irá terminar quando acontecer alguma tragédia, agora fomos nos os visados, mas dia 16 maio esses meninos vêm jogar ao jamor e quase de certeza irá haver pombos sem asas para cima dos autocarros...e continua-se esta espiral de violência.
sem querer puxar a brasa à minha sardinha, mas a atitude do fcp enquanto instituição enojou-me especialmente desta vez...depois de tudo o que sucedeu, do comunicado oficial do slb, a direcção do fcp diz o que diz...tipo, portistas, façam o que quiserem porque esses senhores não têm moral para falar? isto é triste, nunca pensei ver um heli ter de ir à frente de um comboio...onde chegou o futebol o portugal, onde chegou uma rivalidade regional artificialmente criada por PC e seu séquito...temo que o futebol possa vir a ter consequências graves em vários níveis, incluindo na coesão territorial...pode ser que me engane.
até lá é esperar que domingo sejamos campeoões e sentir que eu também fui à guerra....
ASS: Peter-LX
Grande post e grandes comentários.
ResponderEliminarEpah, eu tenho falado com pessoal acerca do jogo e o pessoal não se mostra muito admirado...
Pensarão eles que é normal.
Mas a questão aqui foi a proporção a que chegaram. A proporção: casas do Benfica vandalizadas, autocarro metralhado com pedras e sabe-se lá mais o quê, jogadores e treinador agredidos com objectos mandados da bancada incluindo o Quim que ia sendo imolado (não me lembro disto ter acontecido antes), mulheres agredidas (já nem se respeitam senhoras...). Aliás, profissional, profissional, é o Quim que se manteve concentrado apesar da constante "artilharia" dirigida a ele. Repararam na baliza dele aquando do golo do Bruno Alves? É claro que durante o intervalo, o mesmo lugar foi limpo pelo que se viu...
Agora não me venham com falsos argumentos de que os do Benfica e os do Sporting fazem a mesma coisa. É mentira... A proporção é completamente inusitada. Falta pouco para haver armas em punho...
Eles vêm cá ao Estádio Nacional mas não se preocupem que se eles fizerem besteira a PSP de Lisboa carrega e com força...
Quanto ao comunicado do Futebol Clube do Porto...só me fez rir. O Porto não merece uma direcção assim... O comunicado sofre de um pouco profissionalismo e má-educação assinalável. Mas ao menos o Benfica assim ganha mais adeptos...e fica claro que o FC Porto com a actual direcção irá continuar a ser um clube regional e provinciano (na mentalidade!).
Ser das claques do Benfica aumenta o risco, mas a sensação de ir à guerra sente-se mais quando se vai sozinho mesmo que à paisana. Vi coisas que não lembram ao diabo. O grupo assusta sempre mais do que o individuo que vai com a namorada ou com um grupo muito restrito de amigos. Vi uma caça às bruxas e não foi só malta dos super. Havia ódio em muita gente do Porto por estarmos ali a um golo de sermos campeões. Presenciei homens feitos a baterem em tudo o que se mechia.
ResponderEliminarOk, eu também sei que isto acontece em Lisboa, com os lagartos e com o Benfica. Mas eu já fui muitas vezes a alvalade à civil e não senti tanto receio como senti no domingo. E eu sou cá de cima, não sou de Lisboa. Normalmente em Lisboa há a guerra entre as claques e normalmente as pessoas ditas normais (vocês percebem o que quero dizer, não quero ofender susceptibilidades aqui) portam-se com normalidade. No Porto não. Ninguém foi normal. Foi tudo demente.
A minha historia e um pouco diferente da vossa, sou benfiquista do norte e foi ver o jogo a paisana no dragao com a minha irma o namorado e uma amiga, penso que o mais me impressionou e o odio que aquela gente tem ao benfica, e uma coisa fora do comum... Tirando isso nao vi ninguem ser agredido, vi 2 adeptos do benfica a serem expulsos do lugar onde estavam sentados mas nada de especial eu festejei o golo do benfica curiosamente com um senhor ao meu lado que tambem era benfiquista saltamos gritamos e berramos :D
ResponderEliminarFacto que tambem fiquei a 10 metros mesmo do sector visitante onde estavam a claques do benfica, apoio brutal :D